sábado, 3 de outubro de 2009


uma história que fica por escrever...

um mundo que fica por descobrir...

um sonho que se afunda.

foi um “namoro” longo o que nos juntou. uma paixão, como qualquer paixão, assolapada e inexplicável.

as tuas formas esguias, chamavam por mim naquele estaleiro, há anos, onde não estavas morto. apenas à espera de alguém que te merecesse... alguém que te trouxesse vida de novo à tua alma adormecida.

um barco que espera calmamente pelo seu momento!

o momento em que um marinheiro completa a sua e do barco, as duas numa só, universalidade de navegadores.

o barco que espera por um navegador capaz de o fazer cumprir o seu desígnio. juntos têm como fado o eterno cruzar de mares, rios, baías e oceanos. na busca ou talvez na vivência de uma liberdade experiênciada a cada milha que passa, ou cada estrela cadente que rasga a noite enquanto estamos fundeados.

longas foram as noites de temporal que juntos degustámos...

cada um de nós oferecendo o que tínhamos. tu, um tecto seco, uns sofás suaves e uma cabine quente que não usava. um doce, por vezes amargo dançar nas ondas do mar revolto. e a mim, apenas me cabia ter tudo preparado para o caso de algo correr mal.

na sala deitado, olhava o mastro que riscava com a sua luz no topo, o céu, apontando algumas estrelas e muitas, muitas nuvens a correr. eu... dormitava na canção do vento. por vezes saltava com o susto de um uivo longinquo que nos abraçava inesperadamente no braço de uma rajada de vento inconformado, que parecia querer-nos tirar do mar, levar-nos para outras paragens. levar-nos de um mar agreste, onde os dois, simplesmente repousávamos, esperando que a bonança chegasse, umas horas... um dia... ou uns dias depois!

à tua mesa vi a aura do sorriso dos amigos.

à tua mesa marquei pontos numa carta e risquei rotas sonhadas nos oceanos.

à tua mesa amei uma mulher e alimentei o espírito no verão e no inverno, outono ou primavera...

horas passei olhando o sulcar da água no alto das tuas proas, como que enfeitiçado pelo saltar das gotas numa fonte mágica, no encantamento de uma vaga que nunca se encontra com o seu fim...

mas hoje... apercebi-me que os nossos caminhos se vão separar... vamos seguir rumos diferente...

não mais vou poder olhar o horizonte a 360º e mergulhar na imensidão do mar, e mais mar, e mar...só e apenas mar!

não mais vou poder escutar a chuva a cair languidamente no convés, como se fosse uma canção de embalar.

acho que hoje realizei que uma parte de mim está a morrer...

acho que hoje realizei que o mais antigo sonho de vida, vai desfalecer.

que outras pessoas se irão sentar à tua mesa... outras pessoas que não eu...

num catamaran com 4 cabines, passei horas, dias, semanas de gentil solidão. “faláva” contigo e com a “nossa” cadela preta como a noite. monólogos de gente do mar, que não sabe para onde vai e muitas vezes, talvez até demais, não sabe realmente de onde vem...

hoje, neste momento, sento-me no chão de um quarto de banho, que fica na escada, na casa de uma boa amiga, num redondo e fofo tapete verde, num edíficio antigo, no centro da europa... o mar fica longe. longe demais para o poder sentir ou escutar. apenas o sonho... e deixo que renasça nos meus olhos que um dia sonharam ser de marinheiro...

adeus Boa Idéia...

lamento não ter conseguido ser o teu navegador...

agradeço do fundo do coração as vivências que me permitiste...





3 comentários:

tina disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
tina disse...

É impressionante a ligação que se ganha às coisas.

Este texto é prova de que, estranhamente, conseguimos dar vida a coisas, neste caso uma "coisa" especial, um veleiro.

Um dia ouvi alguém dizer que as "coisas" são âncoras das nossas lembranças. Concordo.
Deve ser esta a razão de tão belas relações.

(para onde foi o Boa Idéia?)

Blue Planet Traveller disse...

Olá!
Eu sou daqueles quem em tempos começou a acreditar que os brinquedos à noite ganham vida!
Hoje gosto da ideia de que tudo ganha vida no plano dos sonhos ou para alguns no espiritual!!!

O Boa Ideia é a agora a minha casa a tempo inteiro. talvez a minha casa do vento...

Até jazz
P